O Congresso Internacional de Evangelização Mundial foi
convocado pela Associação Evangelística Billy Graham e cerca de 4000 líderes do
mais amplo espectro denominacional, oriundos de 151 países, acorreram ao magno congraçamento
que apresentou como tema: "Que o Mundo Ouça a Sua Voz". A
Igreja, espalhada pelo mundo, estava sendo desafiada a reafirmar a sua vocação,
no intuito de considerar estratégias c programas para cumprir a grande
comissão. Em outras palavras, procurava-se visualizar desafios e recursos,
visando à evangelização de todo o mundo.
1. O propósito de Deus
O Pacto de Lausanne começa mencionando a vocação divina,
porque em Deus a Igreja é chamada e enviada à missão. Ele é o Deus missionário.
Tudo começa com Ele.
John Stott comenta que "o primeiro parágrafo do Pacto
expressa a compreensão trinitária da missão e encara a tarefa missionária da
Igreja como uma vocação dos membros do povo de Deus de serem servidores e
testemunhas com vistas à expansão do reino de Deus".18
A) O caráter de Deus
A convenção não pretende fazer uma análise acurada sobre o
Ser de Deus. Mesmo assim, o primeiro parágrafo demonstra que Nele residem as
nossas motivação e vocação. Ele é o único Deus eterno, Criador e Senhor do
mundo.
B) O propósito de Deus
O propósito divino foi chamar um povo para Si. Quando o
acordo faz esta afirmação, apresenta-nos o caráter redentor de Deus.
C) A vocação humana
O Deus que redime é o mesmo que envia o povo redimido, mesmo
em vasos de barro, o Evangelho continua sendo um tesouro precioso.
2. A autoridade e o poder da Bíblia
A Bíblia são as Escrituras do Antigo e do Novo Testamentos,
que, em sua totalidade, refletem aquilo que dá autoridade à vocação da Igreja.
É a partir das Escrituras que a Igreja ouve a voz de Deus, a qual a chama e a
envia à missão.
A) O poder da Bíblia
O Pacto afirma o poder da Palavra de Deus. Quando Deus fala,
também age. Sua Palavra nunca volta vazia para Ele; sempre
cumpre o seu propósito (Is. 55:11).
B) A interpretação da Bíblia
O Pacto esclarece que a mensagem bíblica é a mesma para
todos os homens, em todos os lugares e em todos os tempos. Entretanto, ao mesmo
tempo, enfatiza a participação do Espírito Santo, iluminando as mentes para que
as Escrituras tornem-se verdade constantemente inovadora no coração do ser
humano.
3. A unicidade e a universalidade de Cristo
O terceiro parágrafo é intransigente em sua visão
cristocêntrica, bem como em sua leitura sobre o pecado do ser humano, seu
afastamento de Deus e sua incapacidade de encontrar salvação de per si. Deus,
em Cristo Jesus, tomou a iniciativa de alcançar o ser humano com Sua graça.
A) Ele é o único Salvador
O ser humano dispõe de algum conhecimento sobre Deus,
isto se dá em face da revelação geral. Contudo, este conhecimento não lhe
confere a capacidade de experimentar a salvação. Jesus Cristo é o único
Salvador.
B) Ele é o Salvador do mundo
Por ser Ele, Jesus Cristo, o único Salvador, a
Igreja precisa fazê-lo conhecido universalmente. Proclamar a Jesus Cristo como
"o Salvador do mundo" é anunciar o amor de Deus a um mundo de
pecadores. Amor tamanho, que fez o Senhor dar seu único Filho à morte na cruz.
4. A natureza da evangelização
No seu sermão de início, Billy Graham expressou, como
esperança primeira em relação ao congresso, o desejo de que ele formulasse uma
declaração bíblica sobre a evangelização. Ao final, Grahan, declarou-se
satisfeito, porque entendeu que tal expectativa foi concretizada, tornando-se
esta um fato de consenso em todo o encontro.
No quarto parágrafo, o Pacto inicia com uma definição e
prossegue descrevendo o contexto da evangelização; a saber, o que deve vir
antes e depois dela.
A) Definindo evangelização
A palavra "evangelização" deriva de um termo grego
que representa, em seu sentido literal, "trazer ou difundir boas
novas". Sendo assim, ao falar sobre evangelização, é preciso haver em mente
o conteúdo da evangelização, a pessoa de Cristo Jesus.
B) Prelúdio à evangelização
A verdadeira evangelização nunca ocorre num vácuo. Ela
pressupõe um contexto do qual não se pode isolar. Certa situação
necessariamente a precede. Ao referir-se a tão imprescindível pressuposto, o
Pacto deliberadamente usa as palavras "presença",
"proclamação", "persuasão" e "diálogo".
O prelúdio da proclamação é a presença. Como partilhar o
Evangelho de Jesus Cristo com pessoas com as quais não mantemos nenhum contato?
A presença cristã no mundo não substitui a proclamação, a persuasão ou o
diálogo, antes, vem a ser o preâmbulo de todos estes elementos.
C) Os resultados da evangelização
A evangelização traz como resultado a obediência a Cristo, o
ingresso em sua Igreja (pertencer a Cristo é pertencer ao povo de Cristo, At
2.40, 47) e um serviço responsável no mundo.
5. A responsabilidade social cristã
Indubitavelmente este foi o tema mais controverso de todo o
Pacto, que, inclusive, precisou ser discutido, com mais vagar, em Grand Rapids,
1982. Se, por um lado, o enfoque cristocêntrico demonstrou o
conservadorismo da convenção, de outro modo, quanto ao aspecto social,
testemunhou-se em Lausanne uma visão, no mínimo, progressista. Por agora, não
há a pretensão de desenvolver o prisma do qual partiu o Congresso quanto à
questão social, fá-lo-ei adiante e de forma mais acurada.
6. A Igreja e a evangelização
Neste parágrafo, acentua-se limpidamente que a
Igreja foi enviada ao mundo da mesma forma que o Senhor Jesus o foi e isso
requer uma penetração profunda e sacrificial na sociedade não-cristã.
A) Deixando os guetos eclesiásticos
A Igreja foi chamada para deixar os seus guetos. Fomos
convocados a abandonar as quatro paredes de um templo c, ao nos dirigirmos ao
mundo, impactá-lo com a verdade do Evangelho.
B) Prioridade evangelística
Na missão de serviço sacrificial da Igreja, a
evangelização é primordial. Partindo da premissa do sexto parágrafo, o referido
serviço é inarredável, todavia, a evangelização é algo prioritário.
7. A cooperação na evangelização
No primeiro parágrafo do ajuste há uma referencia ao
propósito de Deus para a Igreja, mas esse propósito encontra-se melhor
trabalhado em dois parágrafos que podem ser estudados conjuntamente. Eles
aludem à missão da Igreja e às suas integridade e unidade.
A) Unidade diante da verdade
O que reveste o testemunho de autoridade é a unidade, o
divisionismo simplesmente depõe contra nós.
B) Unidade mais ampla
A unidade que o sétimo parágrafo enfatiza passa
necessariamente pela uniformidade na verdade, na adoração, na santidade, na
missão e na cooperação, em que o compartilhar recursos e experiências faça-se
presente.
8. Esforço conjugado de Igrejas na
evangelização
O oitavo parágrafo lembra o papel da Igreja, todo o corpo de
Cristo, como comunidade missionária que envia missionários para as mais
diversas, longínquas partes do mundo.
A) Todo o corpo de Cristo, um povo missionário
Esta alínea enfatiza que, no passado, a função dominante das
missões do Ocidente era muito clara, mas hoje, esta função tem desaparecido
rapidamente. Sendo assim, novas frentes missionárias devem ser levantadas,
nesse sentido, todo o corpo de Cristo deve sentir-se responsável pela
evangelização, tanto na sua própria área, na sua própria realidade, como a
partir do envio de missionários a localidades mundiais diversas.
9. Urgência da tarefa evangelística
Tanto o parágrafo oitavo, quanto o nono tratam do
mesmo tema: evangelização. Ambos podem ser lidos e entendidos de forma
conjugada, pois este é o âmago do Pacto de Lausanne.
A) Urgência diante dos esquecidos
Lausanne lembra que mais de dois bilhões e setecentos
milhões de pessoas, dois terços da humanidade, ainda precisam ser alcançados
com o Evangelho de Jesus. Muita gente tem sido esquecida. A Igreja precisa ser
sensível, percebendo que, nos últimos dias, tem existido uma significativa
receptividade à mensagem do Evangelho, sendo assim, ela não pode desprezar tão
considerável oportunidade.
B) Instituições Para-Eclesiásticas
Não obstante o pacto, em seu sexto
parágrafo, destacar que o "meio designado por Deus para difundir o
Evangelho" seja a Igreja, reconhece-se a validade das instituições
para-eclesiásticas, as quais, na missão, devem tornar-se parceiras da Igreja.
C) Missionários estrangeiros
O parágrafo nono sugere que o número de
missionários estrangeiros, bem como o dinheiro enviado para um país
evangelizado sofra significativa diminuição, entendendo que o redutor pode
facilitar o crescimento da igreja nacional e assegurar a autonomia desta.
D) Os milhões empobrecidos
A pobreza de milhões deveria chocar a Igreja. Infelizmente,
o que se tem visto é um acostumar-se com a desgraça alheia, como se isto
representasse apenas um reflexo do juízo divino. A Igreja precisa sentir-se
indignada diante da miséria do outro, abrindo mão de sua opulência, optando por
um estilo de vida simplificado e tornando-se mais generosa diante da
necessidade do outro. Não se pode abrir morada para a alienação no seio da
Igreja de Jesus.
10. Evangelização e cultura
O desenvolvimento de estratégias para a evangelização
mundial requer metodologia nova e criativa. A Igreja precisa ser sábia para
proclamar o Evangelho dentro de culturas distintas, respeitando-as, posto que,
parte delas, é rica em beleza e em bondade.
A) Não existe uma cultura superior à outra
O Evangelho não pressupõe a superioridade de uma cultura
sobre outra.
11. Educação e liderança
O décimo e o décimo primeiro parágrafos lidam com dois temas
relacionados entre si: educação e liderança. Ambos estão atrelados a Igrejas
nascidas do labor missionário.
A) Crescimento com lucidez
Infelizmente a busca por resultados quantitativos tem
caracterizado a Igreja. O crescimento numérico tem sido um grande anseio em
detrimento do crescimento espiritual. Imprescindível haver um nítido
equilíbrio. A igreja deve crescer numericamente sem prejuízos
à educação e ao amadurecimento, demonstrando insofismável interesse pela
edificação de cada crente.
B) Preparando a liderança
A Igreja necessita preparar uma liderança
dentro de sua própria cultura. Os pastores e leigos devem ser treinados e
preparados em doutrina, discipulado, evangelização, edificação e serviço. Esse
treinamento deve ser desenvolvido a partir de iniciativas locais ativas e
criativas e sob o esteio do padrão bíblico.
12. Conflito espiritual
A realidade espiritual hodiernamente vivenciada vislumbra
maior ênfase na décima segunda disposição. O conflito com
principados e potestades do mal que almejam destruir a Igreja e impedir a sua
tarefa de evangelização mundial é uma realidade. Ainda, observa-se que esta
mesma alínea exalta a influência do mundo sobre a Igreja. A
"mundanidade" no cerne da Igreja deve ser vista com preocupação, pois
a mesma pode afetar a sua mensagem e os métodos de evangelização. Sob o eco de
João 17.14-16, a Igreja é advertida a estar no mundo, porém o mundo não
necessita estar na Igreja.
13. Liberdade e perseguição
A Igreja deve desfrutar da liberdade expressa na Declaração
dos Direitos Humanos, enfoca o décimo terceiro parágrafo. Neste ponto, existe
um desafio para que a Igreja denuncie as injustiças que têm solapado muitos
países e, por conseguinte, atingido a Igreja. Existe uma ostentação sobre a
fidelidade, a qualquer custo, lembrando-nos de que servir a Jesus fielmente
pode trazer perseguição.
14. O poder do Espírito Santo
A décima quarta disposição realiza uma afirmação categórica:
"cremos no poder do Espírito Santo". Este parágrafo estimula a Igreja
e desperta-a para viver e caminhar na dependência c no poder do Espírito Santo.
15. O retorno de Cristo
O décimo quinto parágrafo está revestido de esperança. O
retorno de Jesus será o ápice daquilo que a Igreja anseia.19
Para melhor discorrer sobre o tema e o significado do mesmo
para a Igreja de Jesus, transcreve-se abaixo o quinto parágrafo do Pacto de
Lausanne:
Afirmamos que Deus é o Criador
e o Juiz de todos os homens. Portanto, devemos partilhar Seu interesse pela
justiça e pela reconciliação em toda a sociedade humana, e pela libertação dos
homens de todo tipo de opressão. Porque a humanidade foi feita à imagem de
Deus, toda pessoa, sem distinção de raça, religião, cor, cultura, classe
social, sexo ou idade possui uma dignidade intrínseca em razão da qual deve ser
respeitada e servida, e não explorada. Aqui também nos arrependemos de nossa negligência
e de havermos, algumas vezes, considerado a evangelização e a atividade social
mutuamente exclusivas. Embora a reconciliação com o homem não seja
reconciliação com Deus, nem a ação social evangelização, nem a libertação
política salvação, afirmamos que a evangelização e o envolvimento
sócio-político são ambos parte do nosso dever cristão. Pois ambos são
necessárias expressões de nossas doutrinas acerca de Deus e do homem, de nosso
amor por nosso próximo e de nossa obediência a Jesus Cristo. A mensagem da
salvação implica também uma mensagem de juízo
sobre toda forma de alienação, de opressão e de discriminação, e não devemos
ter medo de denunciar o mal e a injustiça onde quer que existam. Quando as
pessoas recebem Cristo, nascem de novo em seu reino e devem procurar não só
evidenciar, mas também divulgar a retidão do reino em meio a um mundo injusto.
A salvação que alegamos possuir deve estar nos transformando na totalidade de
nossas responsabilidades pessoais e sociais. A fé sem obras é morta.20
16. O caráter de Deus
A primeira parte da disposição acima transcrita
focaliza o Ser de Deus, Ele é o Criador e Juiz de todos os homens. Como
afirmou Stott, "é significativo que uma disposição inteiramente
relacionada com a 'responsabilidade social cristã' tenha origem com uma
afirmação acerca de Deus. Isto está certo, pois a nossa teologia deve sempre
governar a nossa conduta".21
Quando a assertiva acima inicia falando sobre Deus, está
querendo dizer que o pilar de sustentação de nossas ações está no caráter do
próprio Deus. Sendo assim, nada melhor do que olhar para o Deus missionário, o
Deus que toma a iniciativa de resgatar a humanidade, o Deus que envia o próprio
filho, filho que não apenas vem como Salvador, incumbido de transferir o ser
humano da terra para o céu, mas, inclusive, disposto a tratá-lo com dignidade,
carinho e atenção. A nossa motivação para agir em favor do próximo deve ser a
ação divina em favor da humanidade.
17. O ser humano
Se na primeira parte da assertiva a exaltação recai sobre o
caráter divino, na segunda, destaca o ser humano. A motivação da igreja na ação
social passa inevitavelmente pela percepção de que Deus criou o ser humano à
sua imagem. Esta percepção deve levar a Igreja ao arrependimento pelos tempos
em que se omitiu e acomodou, deixando de agir de modo que gerasse transformação
e libertação da humanidade em face de qualquer tipo de opressão.
O pacto, com muita felicidade, instiga os cristãos a
partilhar do interesse divino pela justificação e reconciliação de toda a sociedade
humana, pois o ser imagem de Deus e o ser por Ele criado, torna o homem
indistintamente especial, de cujo valor a Igreja não se pode deslustrar,
independentemente de raça, cor, religião, cultura, classe social, sexo ou
idade.
18. Evangelização e ação social
Pretendendo evitar maiores delongas, neste momento, sobre a
relação evangelização-responsabilidade social o que farei posteriormente.
Porém, desde já, saliento o que o Pacto afirma sobre este aspecto.
Lausanne estabelece que a Igreja foi chamada, tanto para a
evangelização, quanto para a ação social, entendendo que são elementos
distintos e que devem integrar o dever cristão, pois ambos relacionam-se com o
Ser de Deus e com o caráter c a necessidade do ser humano. Evangelização e ação
social não são excludentes, ao contrário, devem ser parceiras na missão.
19. Uma voz profética
O parágrafo que ora se destaca também dá ênfase ao papel
profético da Igreja. A mensagem de salvação é mensagem de juízo sobre toda
alienação, opressão e discriminação, desta forma, ela também deve denunciar o
mal e a injustiça onde quer que estes se façam presentes.
20. Salvação deve ser sinônimo de
transformação
A alínea conclui com um desafio ao
compromisso cristão pessoal. Ser cidadão do reino evidencia, na prática, aquilo
que aconteceu na vida por causa da presença de Jesus. E esta presença deve
revolucionar a vida do cristão. Ser cristão, significa ter passado por uma
metamorfose, conceitos e posturas são revistos e transformados.
De alguma maneira, o que foi dito até aqui permite dispor
de um vislumbre do que Lausanne afirmou sobre a responsabilidade social da
Igreja. Mas, se a afirmação de Lausanne foi um progresso, tal atitude não foi
vista com tanta tranqüilidade. O Pacto coloca, lado a lado, a evangelização e a
responsabilidade social, mas não define a relação existente entre as duas. A
responsabilidade social da igreja suscitou discussões quanto à preeminência.
Afinal, quem virá primeiro: a evangelização ou a responsabilidade social?
As discussões e a desconfiança sobre a questão
social em preterição da evangelização foram instrumentos que, em 1 982, em
Grand Rapids, motivaram um grupo a debater e definir mais claramente qual a
relação entre evangelização e responsabilidade social. Com maior exatidão, o
tema será desenvolvido a posteriori.
Texto extraído do livro: Responsabilidade Social da
Igreja/ Calvino Teixeira da Rocha
ISBN-85-8714374-3
1. Teologia Social 2. Igreja -
Responsabilidade social 1. Título.
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1ª edição: Verão 2003
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